quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

09. Buraco do Tatu


Buraco do Tatu

Não tenho mais nada
Não tenho mais nada
O dia, a noite e a madrugada
Tenho os pés no chão
Domingo no eixão
Vento e sol na cara
Que alegria mais barata!
E tenho muitas outras que são de graça.

Não tenho mais nada
Nunca tive carro ou terra
Sou feito de barro
Da lama da baixada
Do verde da vereda
Das areias da Serra
Fui forjado em pedras
Que brotaram das entranhas
Das profundezas da mãe Terra

Quero mesmo é cajuzinho do cerrado
E que o tempo esteja sempre ao meu lado
Quero mesmo é transar na cachoeira
E dançar à noite sob o céu na lua cheia
Quero ser livre pra garantir o meu sustento
E usufruir dos frutos do meu trabalho
Quero minha parte na riqueza coletiva
E dar adeus a este mundo que escraviza

Perdi tanto tempo
Andando na calçada
Sem perceber que o espaço
Era prioridade do carro
E quando havia algum gramado
E algum jardim florido
Não se podia tomar rosas
Não se podia fazer nada
Então percebi que a grama era falsa

Não quero ter mais que ninguém
Não quero ter o que eles têm
E se a ganância vier a mim
Me deixe só com meu fracasso
Me deixe só sendo infeliz
Não seria mais que os outros
Nem seria menos humano
Todos estamos sujeitos
A perecer no que acreditamos

Não tenho para onde ir, mas corro
Pois, a vida é breve como um sopro
Quase sem perceber, corro sorrindo
Pois, hoje o céu faz um dia lindo.
Pois, a vida é uma risada desatada
E a alegria deve ser compartilhada
Tanto quanto o que é produzido
Pelas mãos e gênio, ser humano

E esse silêncio na cidade
Que atravessa as paredes
E vem suspenso no ar
Este murmuro salutar
De que é feito na verdade?
De fato, ruídos de fundo
Que invadem minhas entranhas
Anunciando o fim do mundo...

Alguma coisa acontece no meu coração 
Que só quando a esplanada cruza com o eixão

No eixão, embaixo da Rodoviária do Plano
Há o buraco do tatu
O buraco do tatu 

Na rodoviária do Plano...

“Nossa senhora do cerrado
Protetora dos pedestres
Que atravessam o eixão
às 6 horas da tarde
Fazei com que eu chegue
são e salvo na casa da Noélia”
Nicolas Behr

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